David Fonseca
David Fonseca dispensa qualquer tipo de apresentações. É um dos artistas mais conhecidos no panorama Nacional, e é precisamente na língua de Camões que apresenta o seu mais recente álbum "Futuro Eu" (Opinião aqui). O lançamento do álbum foi o pretexto perfeito para eu conversar com a primeira pessoa que vi ao vivo num concerto. O dia foi especial, pois é um artista que eu e a Mariana seguimos desde sempre, tendo estado várias vezes nas actuações que fez na Queima das fitas de Coimbra.
Vejam então o que ele nos contou...
Vejam então o que ele nos contou...
A todos os artistas o FLAMES pergunta...
Tem algum artista que o inspira?
Não, eu acho que não! Quer dizer, há artistas mais antigos de que eu gosto. E depois há aqueles que podem influenciar em algum momento. Por exemplo, eu ontem estava a ouvir uma banda que se chama Daughter, gosto muito dessa banda, e apeteceu-me começar logo a fazer música. Aliás, comecei a ouvir um tema e a vontade que tive foi de pegar no meu álbum e recomeçar tudo de novo (risos). E depois claro, há sempre aquelas bandas e artistas que eu ouvia mais na adolescência…
Há algum local onde gostaria muito de poder tocar? Ou onde gostaria de levar este seu novo disco?
Não necessariamente. Eu já toquei em muitos sítios, aqui em Portugal já toquei praticamente em todos. Por isso, torna-se um bocado difícil dizer que gostaria de tocar num específico, porque provavelmente eu já lá passei. Olha, onde quer que eu o consiga levar! Gostaria de o levar onde as pessoas o quisessem ouvir ao vivo.
Hum… Já vi muitas coisas engraçadas, já vi muitos cartazes na minha frente. Mas não sei… não há assim nada de especial… Eu gosto quando pedem algumas canções específicas! Acho que é engraçado as pessoas virem com um pedido de uma canção escrita num cartaz… E por acaso já tem acontecido.
Lembra-se de alguma situação caricata ou diferente que tenha ocorrido durante um concerto?
Já aconteceram coisas engraçadas muitas vezes. Já faço isto há muitos anos e já aconteceu um bocadinho de tudo. Já aconteceu pessoas entrarem em palco e pedirem para falar a meio das canções. Já ficamos sem electricidade a meio de um concerto e tivemos que interromper o concerto quatro vezes seguidas.
Diria que as invasões de palco são a coisa mais comum. Pessoas que invadem o palco porque acham que têm de dizer algo… nunca percebi muito bem o porquê. Mas o mais curioso, é que essas situações, quando uma pessoa as descreve, não são tão interessantes como quando elas acontecem de verdade. Ao descrevê-las elas parecem sempre um bocadinho vulgares, mas quando acontecem parecem sempre estranhas e ocorrem de forma espontânea. Eu acho que a espontaneidade, é o que faz delas interessantes, porque não acho nada de novo atirarem coisas para cima do palco, coisas estranhas. Isso acontece muitas vezes…
Ao David Fonseca o FLAMES pergunta...
Foto de Rui Miguel Pedrosa
Este seu novo disco tem como título "Futuro Eu". Se fizermos o inverso e olharmos para o passado, que conselhos daria ao David Fonseca de há 15 anos atrás?
Talvez… alguns! Porque eu quando comecei era muito novo e não sabia muitas das coisas desta profissão… Fiz o que pude e o que achei que era o melhor. Acima de tudo, acho que com o tempo eu aprendi muito. Fiz erros e aprendi muito com eles.. por isso ás tantas, nem dava conselhos! Porque na verdade, se fiz erros, eles permitiram-me aprender. Faz parte. Às tantas sem os erros eu não teria tido a oportunidade de aprender. Acho que é mais divertido dar conselhos para o futuro do que para o passado.
A intuição. Basicamente sigo a intuição. E acho que no caso da Marta foi muito fácil. Eu conheço a Márcia pessoalmente e muito bem, somos amigos há algum tempo, e ela pediu-me para fazer a capa do disco dela e as fotos… Na altura eu estava a trabalhar numa música, e mal a acabei a primeira coisa que me veio à cabeça foi: “esta música ficaria muito mais interessante se a Márcia cantasse comigo”.
Não tenho uma checklist de parâmetros de características que devam ser preenchidas. É intuição pura. Às vezes é com as participações que eu sinto que as canções fazem sentido. Neste caso eu não sabia se ía resultar, mas eu segui a minha intuição e eu acho que resultou muito bem.
O público português estava habituado a ouvir o David a cantar maioritariamente em inglês. Porquê um disco em português nesta fase da sua carreira?
Isso tem um pouco a ver com a reunião dos Silence 4 que fizemos o ano passado. E na altura quando nós fizemos isso, tivemos de ensaiar aqueles temas todos, que já tinham muitos anos, mais de 15 anos!
Eu não sou muito dado a nostalgias, nunca fui, e aquilo confesso que me fez um bocadinho de confusão. Ter de estar 3 dias por semana fechados, só a tocar canções que eu já nem me lembrava, quer dizer… já nem faziam parte da minha pessoa… Já era outra coisa, já significava outra coisa completamente diferente… Não é que não tenha gostado de o fazer, que gostei, mas fazia-me confusão que durante uma parte tão grande da minha vida eu estivesse só focado nisso.
Então como resposta a isso, eu queria que este fosse um disco novo. Acho que o facto de ser em português tem a ver com a distância que vai desde essas primeiras canções e no fundo responder a isso criativamente por oposição. Ou seja, de repente eu estava a opor-me a todas essas ideias e de uma forma tão radical que inclusive foi em português que elas surgiram. Não foi efetivamente uma decisão. No meio dessa confusão e da minha procura de novas músicas, houve uma frase em português que me soou muito bem e que depois se tornou numa canção e que depois comecei a perseguir e achei que fazia sentido e foi assim que aconteceu, não foi assim nada programado…
Os temas "Hoje eu não sou", "Só uma canção no mundo" têm como enfâse o conceito de perda. O que o inspirou a cantar sobre este assunto tão triste e delicado?
Há sempre muitas coisas que me empurram a escrever sobre este tipo de temas. Uma das coisas que me empurra mais prende-se com o facto de eu achar que a melancolia é claramente um dos estados que eu acho necessários para uma pessoa entender melhor a vida. Entender melhor esses estados melancólicos é ser também ser um bocadinho mais feliz, acho eu.
Eu acho que algumas dessas canções são um bocadinho mais específicas, e sim falam de alguma perda, apesar de eu achar que não estou a incutir nenhum momento especial… nada significativamente muito específico entre as canções, é muito mais uma sensação de perda do que propriamente uma história real, mas que obviamente decorrem de uma sensação de perda em que eu já tive. Isso é normal, não é? Uma pessoa escreve sobre temas que acabam por ser um bocadinho pessoais de qualquer maneira… Mas esses temas abordam mais o tema do que propriamente uma história real, aliás, como todos os temas, acho eu.
Uma pessoa quando escreve tem obviamente algo pessoal naquilo que escreve, não sendo necessariamente o “contar de uma história”. Uma canção não tem de equivaler especificamente a um determinado episódio da vida. Se calhar uma canção até tem a ver com 7 ou 8 episódios da vida de uma pessoa mas… Sim… serviram-me de inspiração várias coisas diferentes… Mas mais o sentimento em si do que propriamente uma história.
É evidente a sua preocupação com a componente estetica do álbum. Porque escolheu estas fotos em particular e porquê um enfoque tão grande na questão da maçã?
A maçã, porque como o disco é todo em português, eu achei que seria curioso usar a metáfora da maçã. A metáfora do pecado, que eu achei que era irónico, porque… é uma espécie de ironia, não é? Como se fosse um pecado cantar em português, um pecado que eu iria cometer… Era uma boa imagem para estabelecer essa ligação, as canções também são um bocadinho provocatórias, acho eu. Não são muito descontraídas. São claramente mais provocatórias do que descontraídas o que tinha a ver com essa ideia de pecado…
O que é que o David conseguiu alcançar/realizar com este álbum que não tinha conseguido com os seus trabalhos anteriores?
Cantar em português (risos). Foi algo que consegui alcançar.
Não sei o que é que espero alcançado (risos) mas acima de tudo, aquilo que me salta mais em mente é o facto de ter conseguido fazer isto tudo em português. Isto é uma coisa que realmente nunca pensei conseguir fazer e sinto-me orgulhoso de ter um disco que é em português e que consegue dar continuidade a uma espécie de universo musical meu, isso é uma coisa que me alegra e orgulha bastante. Mas não sei o que irei alcançar com ele… quer dizer, eu acho que vai relativamente bem. Muito sinceramente eu acho que este disco contém algumas das minhas melhores músicas de sempre. Quanto a mim, é uma das colecções das minhas melhores canções que eu já consegui colocar num disco.
A mensagem global que o disco nos transmite é a de um amor que não resultou. Era esta a ideia central que queria passar com este trabalho?
É curioso… mas sim, é possível que haja esse lado mais melancólico, lá está. Mas eu não sei se será só isso, porque há musicas como o “Agora é a nossa vez”, “Chama-me que eu vou” que são o oposto disso… São o oposto dessa ideia de perda. Portanto, nem todas as canções falam exactamente sobre essa ideia, muito pelo contrário. Às vezes algumas músicas funcionam mais como uma reflexão, outras são um bocadinho mais sobre a perda, outras sobre a ideia da esperança… porque realmente as coisas são de facto misturadas nisto… Eu não acho que o disco tenha necessariamente uma mensagem, ou ideia central. Não é assim que eu construo as canções nem os discos. Acho que cada canção tem uma ideia específica, não necessariamente uma mensagem, não estou a enviar uma mensagem a ninguém… Eu estou a fazer música para mim, em primeiro lugar! Portanto depois aquilo que eu realmente espero, é que a canção contenha um certo tipo de história em que as pessoas se sintam próximas delas, no sentido em que já passaram por essa história… Mas não há necessariamente uma mensagem.
Tem assim alguma música que goste mais, uma favorita?
Gosto muito da canção “Deixa ser” com a Márcia, é uma canção muito específica. Acho que foi mesmo a última canção que surgiu. Eu senti que havia qualquer coisa que faltava e foi quando apareceu a “Deixa ser”, que era exactamente aquilo que faltava no disco. E depois convidei a Márcia.
Tivemos a oportunidade de o ver também em concertos na Queima das Fitas de Coimbra já há alguns anos atrás, com um público maioritariamente composto por estudantes. Para o David o tipo de público que tem influencia a sua performance?
Mas ao vivo?
Sim, sim, ao vivo.
Ah, sim, completamente. Acho que é inevitável, uma das coisas boas de tocar ao vivo é que as coisas podem acontecer de forma radicalmente diferente a cada sítio que uma pessoa vai. O público tem uma influência gigantesca. Se eu estou a tocar numa Queima das Fitas às 2h da manhã, é óbvio que a energia do espectáculo vai ser diferente do que tocar se calhar, num teatro às 9 da noite com as pessoas todas sentadas numa cadeira. Os espaços são universos muito distintos e o próprio alinhamento vai ser diferente, as pessoas vão ser diferentes, as coisas vão acontecer de maneira diferente… É normal que eu adapte um pouco o espectáculo ao público e ao local.
Como é que depois de tantos anos a fazer música ainda consegue arranjar inspiração para continuar a produzir canções novas e discos novos?
Eu acho que a música não é acerca de… como é que eu hei-de explicar? Eu acho que a música não serve para preencher algo, tipo uma cota.
Não se trata de ser melhor nem pior. Há uma coisa que eu nunca percebi que é quando as pessoas dizem “este disco é melhor que o anterior”. Eu não sei o que é melhor, efetivamente não sei como é que uma pessoa acha que é melhor ou pior. Aquilo que eu acho, é que, me identifico com o tipo de pessoa que sou nesse específico momento e isso é a minha melhor arma, não é? Este agora sou eu, sou o “eu” de 2015. Aqui à uns anos atrás era um “eu” com outro estado de espírito, e isso é o que se traduz depois nos discos, são os diferentes estados de espírito nos diferentes momentos. Porque de certeza que daqui por um ano, vou ter outras coisas que se passaram e marcaram a minha vida, a idade será outra, o momento é outro… e isso transforma-me numa pessoa diferente e altera o meu próprio trabalho. Por isso é que eu acho que a criatividade tem muito a ver com a passagem do tempo. Quanto mais o tempo passa mais coisas nos acontecem que nos levam a determinados sítios e a criar coisas novas.
Muito obrigada ao David Fonseca por esta oportunidade!
Desejamos todo o sucesso que o disco efectivamente merece!
Cantar em português é uma coisa que dá trabalho e é difícil. Daí muita gente usar a desculpa "gravo em inglês por causa do mercado ser melhor". Tretas, quando se é bom vende-se. Não estou a dizer que os artistas que o fazem não prestam, longe disso. Acho simplesmente que se conseguem coisas MUITO bonitas na "língua de Camões" quando nos esforçamos.
ResponderEliminarParabéns ao FLAMES e ao David Fonseca. ;-)
Obrigada Alipio pela simpatica mensagem! É bem verdade, por vezes cantar em PT pode ser bem mais dificil.
EliminarO David está sem duvida de parabens :9