Marco Rodrigues
Foi com apenas 15 anos de idade que Marco Rodrigues começou a cantar fado, mas pode dizer-se que o mesmo já lhe corria nas veias desde que nasceu.
Estreou-se na gravação de álbuns com o disco "Fados da Tristeza Alegre" (2006), ao qual se seguiram "Tantas Lisboas" (2010) e "Entretanto" (2013). Agora, dois anos depois, Marco brinda os seus fãs com mais um trabalho de estúdio, o aguardado álbum "Fados do Fado".
O FLAMES esteve à conversa com o artista e ficámos a saber mais sobre este apaixonado fadista.
A todos os artistas o FLAMES pergunta...
Quais são os artistas que mais o inspiram?
Humm... Eu gosto muito de música. Ouço muita música e há muitos anos, os mais diversos artistas. Em Portugal, Toni de Matos, Max, Carlos do Carmo, Tristão da Silva, Francisco José, entre outros, são nomes muitos importantes para a música que crio. Por outro lado, também gosto de boa música brasileira, como Chico Buarque. Ou então, Frank Sinatra e outros nomes sonantes da música, que ouço frequentemente e realmente me inspiram enquanto artista.
Qual é o local onde mais gostaria de actuar?
Tive a felicidade de actuar em algumas das salas mais importantes, em particular em Portugal. Mas já actuei com a Marisa no Royal Festival e gostaria de repetir a experiência, desta feita a título individual. A sala Royal Albert Hall é realmente deslumbrante.
Que mensagem gostaria de ver ser erguida num concerto seu?
Pois… a nível social existem várias mensagens que gostaria de ver erguidas. Só porque vivemos numa sociedade e esta sensibilização é muito importante, sendo que eu próprio me identifico com algumas causas. Contudo, num aspeto mais individual, seria alguma mensagem que desincentivasse o uso de telemóveis durante o espectáculo. É uma situação mesmo aborrecida, porque as pessoas estão a perder a oportunidade de usufruir da arte que está a acontecer, estão a distrair as pessoas em volta. E convenhamos, ninguém volta a ver essas fotografias e esses vídeos. Acho que é de uma falta de gosto e de sentido de oportunidade. Quando estamos num concerto deveríamos estar a prestar atenção ao momento, ao que está a acontecer e não estarmos de volta dos telemóveis e das câmeras.
Recorda-se de alguma situação caricata que tenha ocorrido num concerto seu e que queira partilhar?
Já acontecerem várias. Deixa-me pensar numa que tenha acontecido ultimamente. Há uns temos atrás estava num teatro em Sines, o seu fórum cultural e, como de costume, estava a fazer um tema em acústico no final do concerto. Criou-se um ambiente particular, em que as pessoas estavam mesmo absorvidas pela música até que, de repente, um holofote estourou. Com o susto, um dos músicos, que estava ao meu lado, até saltou e saiu mesmo de onde estava com o medo. Quebrou-se o momento mas recuperou-se facilmente.
Ao Marco Rodrigues o FLAMES pergunta...
Começou a cantar fado desde muito jovem. De que forma é que o fado influenciou o seu desenvolvimento enquanto ser humano?
Boa pergunta! Eu comecei a cantar muito cedo. Quando vim para Lisboa tinha 15 anos, estava a formar a minha personalidade. O fado é uma música de sentimentos, requer uma certa postura para se transmitir a sua mensagem, então o fadista tem de ser particularmente sensível. Enfim, acho que o fado influencia a forma de estar de um artista e creio que, a mim em particular, tornou-me mais sensível e emotivo.
É o próprio Marco quem afirma que os homens fadistas têm caído para segundo plano, sendo as fadistas quem tem recebido uma maior atenção por parte da imprensa e dos fãs nos últimos anos. Que motivos acha que poderão ter conduzido a esta realidade?
Bom, não fui eu quem chegou a essa conclusão sozinho. Esta é mesmo a realidade. É muito mais difícil dizer o nome de 5 homens fadistas do que de 10 fadistas mulheres. Creio que isto se deve a dois fatores. Num primeiro momento, foi o fenómeno da globalização do fado pela Amália Rodrigues. O fado chegou a todo os pontos do planeta, então é natural que se tenha começado a associar, particularmente no estrangeiro, o fado à voz feminina. Num segundo momento, após o fado ter caído em esquecimento, quem o reavivou foram, novamente, as vozes femininas. Daí a associação que se faz do fado com as mulheres. Mas é engraçado que, historicamente, isto não seja verdade; tanto os homens como as mulheres ditaram a história do fado. Eu percebo que haja um certo “je ne sai quoi” que ligue as mulheres ao fado, talvez sejam mais “apetecíveis”, se bem que não é esta a palavra que quero usar. Enfim, as mulheres são mais facilmente contratadas, só é pena que actualmente haja pessoas que não conseguem nomear homens fadistas.
Este seu quarto trabalho, o álbum "Fados do Fado", é composto por temas de diversos fadistas aos quais o Marco deu o seu cunho pessoal. Por se tratarem de temas que já existiam considera que compor este álbum foi mais fácil ou mais difícil do que quando criou os seus três primeiros trabalhos?
Bom, uma das caraterísticas do fado é a criatividade dos intérpretes. No fado tradicional, o artista, ao som da mesma música, pode interpretar diferentes poemas. E é neste sentido que surge o meu álbum. Tudo isto para dizer que, de certa forma, é um desafio maior porque, quando se apresenta um tema pela primeira vez não há nenhum ponto de referência. Assim, quando pego numa música icónica, que atravessou gerações, torna-se mais complicado porque já houve muitas pessoas que interpretaram esta música muitíssimo bem. Mas confesso que tem um gosto especial, interpretar estes temas.
Em que se baseou para seleccionar os temas que compõem este álbum?
Baseei-me no reportório musical dos homens mais impactantes da música nacional. Tentei perceber quais foram os fados mais marcantes na história e, através da minha interpretação destes, homenagear os homens por detrás deles. Se bem que se trata de uma homenagem em geral ao homens da música, porque seria impossível homenagear um a um.
Em "Fados do Fado" contou com a colaboração do Diogo Clemente, um conceituado produtor que já trabalhou com outras grandes vozes do fado. O que aprendeu o Marco com esta colaboração e que conselhos irá usar daqui em diante?
Eu já conheço o Diogo há muitos anos, nós somos da mesma geração. O Diogo é um excelente produtor e um músico igualmente bom, então achei que ele era a pessoa indicada para produzir este meu álbum. E isto porque, como queria criar um disco de clássicos, é preciso dar-lhes um cunho bastante pessoal mas (e por isso mesmo) também temos de ter muito cuidado. E acho que o Diogo me ajudaria nestes dois aspetos. Um dos segredos que penso levar para os meus próximos álbuns, foi a pré-produção que fizemos. Eu cantava e ele tocava, o que nos permitiu perceber as formas mais confortáveis de interpretar o tema, a forma como pronunciava certas palavras e toda uma série de nuances que verificámos atempadamente e que depois possibilitou uma produção muito mais suave.
Como é possível reinventar o fado a cada álbum que se cria?
Quando se faz música de uma forma transparente e se atende às caraterísticas da música, não é muito difícil. Pode ser caótico rearranjar um tema que não se conhece, se bem que corremos sempre riscos quando queremos inovar. Mas o fundamental é adoptar uma atitude transparente para com a música e tudo o resto irá fluir de uma forma bastante natural. Claro que algumas pessoas vão gostar e outras não, de todo, mas não há muito que se possa fazer em relação a isso.
Se pudesse descrever o fado numa frase qual seria?
[pensativo por uns brevíssimos momentos] “Forma de estar na vida”. Eu sei que é um cliché, mas não deixa de ser menos verdade por isso. Quando se entra numa casa de fado percebe-se que há todo um ambiente peculiar, uma postura diferente, um clima diferente. O fado não é só a música por si só, traz consigo algumas coisas que o tornam tão especial e que me levam a crer que pode ser encarado como um estilo de vida.
Muito obrigada ao Marco Rodrigues e um obrigada especial à Cátia Almeida sem a qual esta entrevista não teria sido possível!
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